Autora: Nicole Costa Lemes1 Revisado por: Julia Pirani Cabral2

Ocorrendo pela primeira vez em 1995, a Conferência das Partes (COPs) completa, em 2025, uma trajetória de três décadas, escolhendo como sede de seu 30º encontro o Brasil, mais especificamente Belém, no Pará. Caracterizada como o principal órgão decisório da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), cuja criação na Rio-92 inaugurou o regime internacional de mudanças climáticas, as COPs ocorrem sob periodicidade anual em países diferentes a cada edição. Sua função principal é debater soluções e compromissos para implementação de medidas de combate às mudanças climáticas pelas 198 partes, ou países signatários, da UNFCCC. 

Foi a partir do processo decisório da COP que foram elaboradas e adotadas normas vinculantes de grande importância internacional, como o Protocolo de Kyoto (1997) e o Acordo de Paris (2015). Sendo orientadas pelo princípio de “responsabilidades comuns, porém diferenciadas”, a UNFCCC e a COP fazem a diferenciação entre os países industrializados, que contribuíram proporcionalmente mais que os países em desenvolvimento para as alterações climáticas e o efeito estufa, causado pela emissão de gases do efeito estufa (GEE) na atmosfera. Dessa forma, no Protocolo de Kyoto, os países desenvolvidos (chamados de Anexo I), tomariam a dianteira no processo de redução de emissões de GEE a partir de metas determinadas, sendo acompanhados posteriormente pelos países ainda em desenvolvimento. Salienta-se que os países do Anexo I haviam contribuído, entre 1860 e 1990, com 80,94% das emissões acumuladas de CO2, contra 19,06% de todos os demais países (Souza e Corazza, 2017). 

Os resultados do Protocolo, por sua vez, indicam que ele foi pouco robusto e teve desempenho aquém do esperado, o que pode ser explicado pela mudança no padrão de emissões dos países em desenvolvimento, bem como o baixo engajamento de grandes emissores do Anexo I, como os EUA,  que não ratificaram, e o Canadá, que deixou as negociações em 2011. Já seu sucessor, o Acordo de Paris, foi elaborado com uma arquitetura diferente, na qual as metas de redução seriam para todas as partes, sem distinção entre Anexo I e não-Anexo I, bem como seriam voluntárias, de acordo com a capacidade de cada país. Tal instrumento de redução de emissão de GEE é denominado Nationally Determined Contributions (NDC) e deve ser apresentado a cada cinco anos (Souza e Corazza, 2017). 

A partir disso, a importância de discutir as perspectivas para a COP30 e sua ocorrência no Brasil, especialmente na região amazônica, aponta para várias direções, dado o impacto global do bioma amazônico e do potencial de seus recursos. Para os fins deste documento, concentrará-se no papel que o Brasil pretende exercer enquanto liderança ambiental internacional e nas lacunas da atuação da UNFCCC e da COP. A escolha de destacar tais elementos vêm principalmente das críticas feitas por grupos ambientalistas e cientistas do clima sobre a negligência de temas importantes nas últimas COPs, bem como a participação exacerbada de lobistas do petróleo e pouco espaço para participação de grupos vulneráveis aos efeitos das mudanças climáticas. A própria escolha do local das últimas COPs, quais sejam Egito, em 2022 (COP28), Emirados Árabes Unidos, em 2023 (COP28), Azerbaijão, em 2024 (COP29) foi fruto de problematizações, uma vez que todos são membros plenos ou observadores da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP). Assim como o é o Brasil, que anunciou sua adesão na OPEP+3 na ocasião da COP28, ganhando o anti-prêmio irônico “Fóssil do dia”

Além disso, o Brasil vem apresentando um posicionamento contraditório em relação à pauta climática. Isso porque vem, desde a COP27, buscando retomar o protagonismo ambiental perdido durante o governo de Bolsonaro, alinhado ao discurso do negacionismo climático. Na ocasião, o recém-eleito e ainda não empossado Presidente Lula fez um discurso alinhado com o reconhecimento da importância do combate ao aquecimento global, inflando expectativas de que o clima seria prioridade em seu governo. Apesar da melhora dos indicadores de desmatamento no Brasil, principal responsável pelas emissões de GEE no país, e da retomada dos encontros da Cúpula da Amazônia logo em seu primeiro ano de mandato, em 2023, houve também retrocessos nessa mesma matéria. O exemplo mais claro é o apoio do governo à exploração de petróleo na Foz do Rio Amazonas, empreitada que contraria especialistas e parecer técnicos de órgãos de fiscalização ambiental. O embate do governo federal e do IBAMA é emblemático nesse sentido, marcando um dos elementos contraditórios que atravessam a relação do Brasil com o clima, bem como a discrepância do tratamento do tema na esfera doméstica e internacional.

A conjuntura internacional também cumpre papel relevante no que tange as expectativas para a COP30. Isso porque o segundo maior emissor de GEE do mundo, os Estados Unidos, saiu novamente do Acordo de Paris, repetindo o que já havia acontecido no primeiro mandato de Donald Trump, em 2016. A fim de que o Acordo de Paris cumpra sua finalidade de limitar o aumento da temperatura média em até 1,5 ºC em relação aos níveis industriais, é imprescindível que os principais emissores contribuam com metas claras e consistentes de abandono de combustíveis fósseis. O cenário, contudo, aponta para outro lado em países como os EUA: esfacelamento do multilateralismo, negacionismo climático e incentivos ao uso de combustíveis fósseis. Ademais, menos de um terço dos signatários do Acordo de Paris apresentaram seus NDCs de 2025 (ou NDC 3.0), enquanto outros apresentaram-os sem muita ambição, produzindo resultados incompatíveis com as metas do Acordo de Paris. De acordo com o Relatório sobre a Lacuna de Emissões 2025, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), os NDCs atuais conseguiriam limitar o aumento a 2,3 °C, se implantados integralmente. 

Gráfico I


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Esses elementos são apenas alguns dos que corroboram para que a COP30 seja um momento importante para o regime internacional de mudanças climáticas. Uma das principais tensões formadas na esfera das COPs é a transição energética, ou o abandono do uso de combustíveis fósseis e substituição por matrizes energéticas mais limpas. Apesar de ter sido ignorado em muitos eventos, não obstante seja a utilização de combustíveis fósseis uma das, se não a maior, causa do aquecimento global, a COP28, que se deu em Dubai no ano de 2023, tratou brevemente sobre a transição energética. Mesmo sem mencionar como e quando, já considera-se um avanço; contudo, em 2024, com a COP29, realizada em Baku, o tema sequer foi mencionado. A expectativa, portanto, é de que o tema seja abordado na COP30, como indicam algumas das comunicações feitas por Corrêa do Lago, presidente do evento.

Tem-se, ainda, outros pontos controversos em relação à “COP da Amazônia”, como a negligência logística em relação aos serviços de hotelaria da cidade de Belém, a qual pode vir a tornar o evento excludente. Os preços abusivos de estadia e a incapacidade do governo brasileiro de oferecer alternativas adequadas para o problema inviabiliza a participação plural no evento e o acolhimento das demandas da sociedade civil, sobretudo de grupos vulneráveis com pouco apoio financeiro. Assim, num contexto em que o fomento da atividade petroquímica é motivo de trocadilho e piada entre os líderes do país que sediará a COP30, o Brasil, e do que nega as alteraçõesalterçaões climáticas, os EUA, quedam dúvidas sobre os resultados do evento e o nível de comprometimento que será adotado pelas partes. 


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  1. Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Universidade Federal de Uberlândia e bolsista FAPEMIG. Lattes: http://lattes.cnpq.br/0906838058043633. E-mail: nicole.lemes@ufu.br.
    ↩︎
  2.  Mestranda em Relações Internacionais pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com o financiamento da CAPES. Formada em Relações Internacionais pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Contato: juliapirani.cabral@ufu.br. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/4965117231283044.
    ↩︎
  3.  A OPEP+ refere-se à aliança entre os países que são membros oficiais da OPEP com outros grandes produtores de petróleo, como a Rússia. ↩︎
  4. <iframe src=’https://flo.uri.sh/visualisation/26061895/embed’ title=’Interactive or visual content’ class=’flourish-embed-iframe’ frameborder=’0′ scrolling=’no’ style=’width:100%;height:600px;’ sandbox=’allow-same-origin allow-forms allow-scripts allow-downloads allow-popups allow-popups-to-escape-sandbox allow-top-navigation-by-user-activation’></iframe><div style=’width:100%!;margin-top:4px!important;text-align:right!important;’><a class=’flourish-credit’ href=’https://public.flourish.studio/visualisation/26061895/?utm_source=embed&utm_campaign=visualisation/26061895′ target=’_top’ style=’text-decoration:none!important’><img alt=’Made with Flourish’ src=’https://public.flourish.studio/resources/made_with_flourish.svg’ style=’width:105px!important;height:16px!important;border:none!important;margin:0!important;’> </a></div> ↩︎

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