Autor: Vinicius Gomes Costa1

Data de Publicação: 15/10/2024

Revisor: Richard Rodrigues de Souza Silva

1 – Introdução

No atual cenário econômico e político, os países e instituições privadas que investem mais em tecnologia, por meio de programas de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), indubitavelmente se destacam em relação aos demais no cenário internacional. Além dos Estados Unidos, que já possui um longo histórico de investimento em tecnologia, observado, principalmente na região oeste do país, no Vale do Silício, outro país que merece atenção nesse cenário é a China. Dentre os diversos setores em que a disputa tecnológica está evidente, a exemplo da produção de semicondutores e do desenvolvimento de softwares, um setor se destaca atualmente: o automobilístico.

Atrelando-se a disputa tecnológica com o desenvolvimento sustentável, o consumo de carros elétricos ganhou espaço no mercado internacional e está, aos poucos, se consolidando em diversos países. Neste informe, analisar-se-á a disputa tecnológica entre a Tesla, fabricante de carros elétricos estadunidense, e a Build Your Dreams (BYD), fabricante de veículos elétricos chinesa.

2 – Taxação de veículos elétricos importados pelos EUA e pela União Europeia

Apesar do crescimento na produção e venda dos carros elétricos nos últimos anos, observa-se no ano presente, um movimento contrário à importação de carros elétricos pelas principais potências econômicas do ocidente.

Durante a corrida presidencial à Casa Branca, no ano de 2024, a taxação de veículos importados, incluindo os elétricos, ocorreu antes mesmo da decisão do novo presidente dos Estados Unidos. Em 13 de setembro de 2024, há menos de 2 meses para as eleições presidenciais nos Estados Unidos, o governo dos Estados Unidos, na administração de Joe Biden, noticiou a taxação de produtos produzidos pela China, incluindo taxação de 100% em veículos elétricos chineses, incluindo os produzidos pela BYD, além de taxações em 50% em células de placas solares, para produção de energia fotovoltaica, e 25% em minerais diversos, como alumínio e aço, utilizados na produção de baterias. As sanções, evidentemente motivadas pelo crescimento do setor tecnológico e automobilístico chinês, entraram em vigor 2 semanas depois, em 27 de setembro de 2024, há, aproximadamente, 1 mês das eleições.

Além do movimento contrário à importação, evidenciado na política dos Estados Unidos, a União Europeia também está seguindo o mesmo caminho. Mesmo havendo uma significativa divergência acerca do assunto entre os países do bloco, foi aprovada, em 4 de outubro de 2024, pela Comissão Europeia, a imposição de diversas tarifas à importação de carros elétricos, tanto os produzidos pelos Estados Unidos quanto pela China. Indica-se que haverá tarifa de 7,8% para a importação de veículos produzidos pela Tesla e tarifa de 17,4% para os veículos automotivos produzidos pela BYD. Em relação à divergência entre os países do bloco, citada anteriormente, entre os 27 integrantes, 12 se abstiveram, 10 foram a favor, incluindo: Bulgária, Dinamarca, França, Holanda, Irlanda, Itália, Polônia, Lituânia, Letônia e Estônia, ao passo que 5 países foram contrários à medida, sendo eles: Alemanha, Hungria, Eslováquia, Eslovênia e Malta.

Essa divergência representa, de certa forma, um fator com um grau de fragilidade considerável, até mesmo dentro do bloco europeu, haja vista o elevado número de países que se abstiveram da votação. Este é o caso da França, que possui grande importância no cenário internacional, devido ao histórico de relações diplomáticas, que incluí as comerciais e as de cooperação política; Itália, que passou a adotar medidas políticas e econômicas mais conservadoras a partir do governo de Giorgia Meloni; e Holanda, que possui o maior porto marítimo da Europa, o porto de Roterdã. Essas nações estão adotando um caminho que afetará as dinâmicas comerciais tanto com a China quanto com os Estados Unidos.

3 – Expansão para novos mercados consumidores

Apesar das políticas econômicas de restrição à compra de veículos elétricos na Europa e nos Estados Unidos, nos demais países (como no caso do Brasil) diversos incentivos fiscais estão sendo oferecidos pelas empresas para atrair novos compradores. Esse é o caso da BYD, que, em março de 2024, anunciou a construção da primeira fábrica de carros elétricos no Brasil. No contexto do anúncio, evidenciou-se que a nova fábrica; (que iniciará suas operações em 2025); estará localizada em Camaçari, na Bahia, no mesmo local em que a fábrica da Ford, montadora estadunidense que anunciou o fim de suas operações no Brasil no início de 2021, fabricava seus carros, sendo esse, um fator que evidencia a relação bilateral comercial entre a China e o Brasil.

Em relação à expansão da Tesla para novos mercados consumidores, ao contrário do movimento expansionista observado pela fabricante chinesa, não ocorre, pelo menos não na mesma proporção. Em relação à América Latina, por exemplo, o único país que possui atividades da fabricante é o Chile, devido, principalmente, às grandes reservas de lítio na região, (mineral extremamente importante para a fabricação de baterias de carros elétricos).

Somado à expansão da montadora estadunidense na América Latina, a fábrica se consolidou, também, na Europa, presente na maioria dos países integrantes da União Europeia, apesar dos recentes embargos tributários. Apesar de estar associada ao desenvolvimento sustentável, a expansão da Tesla na Alemanha, na cidade de Brandemburgo, foi apontada como causadora do de uma intensa atividade de desmatamento, provocando a derrubada de 500 mil árvores no local da futura fábrica de carros elétricos, representando-se, assim, o contraponto do objetivo final da montadora, haja vista, também na construção dessa fábrica, outras ações prejudiciais ao meio ambiente, a exemplo da mineração irregular e do descarte irregular de materiais como diesel e tinta.

4 – Parcerias estratégicas

Acerca de parcerias estratégicas realizadas pelas montadoras, destaca-se, recentemente, a parceria entre a BYD e a Uber. Divulgada em agosto de 2024, a parceria entre a montadora chinesa e a plataforma de mobilidade urbana, pretende favorecer, mutuamente, ambas as empresas. A Uber, com o objetivo de atrelar seu serviço às práticas de desenvolvimento sustentável, está renovando sua frota, oferecendo incentivos aos motoristas a adquirirem veículos elétricos fabricados pela BYD, ao passo que, a montadora chinesa, com essa parceria, pretende expandir seu mercado consumidor para novos países, visto que a Uber já está consolidada em diversos países no mundo. Destaca-se que, nessa parceria, os Estados Unidos não foram incluídos, haja vista a taxação, identificada em sessões anteriores desse informe, aos veículos produzidos na China, dentre eles os da BYD.

No acordo, ficou estabelecido a adição de 100 mil veículos em países da Europa e da América Latina, que, futuramente, estender-se-á à países do Oriente Médio, além do Canadá, Austrália e Nova Zelândia. Por fim, acerca de parcerias no entretenimento, a BYD anunciou, também em 2024, o patrocínio à dois grandes campeonatos esportivos, a UEFA Champions League, na Europa, e a Copa América, representando-se, assim, uma maior visibilidade à montadora chinesa por meio de estratégias de soft power.

Em relação às parcerias estratégicas da Tesla, mesmo não estabelecendo parcerias na mesma proporção que a montadora chinesa, uma parceria inusitada, estabelecida no primeiro semestre de 2023, chamou a atenção dos consumidores e do mercado. A Tesla anunciou que os veículos elétricos fabricados pela Ford e pela GM, duas montadoras norte-americanas, passariam a ser compatíveis com as estações de carregamento da Tesla. Apesar da concorrência existente, tratando-se de três empresas no mesmo setor, em uma breve análise, o movimento de aproximação entre as montadoras, redobrará a atenção dos consumidores aos veículos elétricos, promovendo o aumento de vendas da Tesla.

5 – Situação atual dos EVs no Brasil

Realizando-se uma análise ao atual cenário brasileiro nesse aspecto, infere-se que, diferentemente de países mais desenvolvidos, não há estações de carregamentos de EVs na mesma proporção que nos Estados Unidos, por exemplo, onde a parceria foi firmada. Contudo, com o aumento na frota de veículos elétricos no Brasil, a tendência é tornar os pontos de carga mais acessíveis, até mesmo em locais com menor densidade demográfica, conforme apresentado no seguinte infográfico.

Gráfico 1: Quantidade de eletropostos no Brasil

Fonte: Poder 360, 2024.

Assim como a quantidade de eletropostos no Brasil subiu consideravelmente nos últimos anos, a venda de carros elétricos acompanhou esse movimento, alcançando quase 1% do total de veículos vendidos no país em 2023. De acordo com o gráfico a seguir, apesar da venda dos elétricos não sofrer grande aumento até 2018, a partir de 2020, o movimento de compra desses veículos subiu exorbitantemente, alcançando quase 20 mil vendas ao final do ano de 2023, conforme apresentado no gráfico a seguir, a partir dos dados da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), veiculados pelo jornal digital Poder360.

Gráfico 2: Quantidade de veículos elétricos vendidos no Brasil

Fonte: Associação Brasileira do Veículo Elétrico e Poder360 (elaboração própria)

6 – Conclusão

Indubitavelmente, os carros elétricos estão conquistando, aos poucos, novos mercados consumidores ao redor do mundo, contribuindo, não somente para a diversificação do setor automobilístico, como também para a promoção de alternativas de mobilidade urbana e rodoviária mais sustentáveis, aliadas às políticas de preservação ambiental. Ressalta-se que o setor de carros elétricos está crescendo significativamente nos últimos anos, conquistando novos mercados consumidores e aprimorando os veículos elétricos por meio de uma série de programas de pesquisa e desenvolvimento. Conforme identificado na expansão da Tesla na Alemanha, que provocou diversos protestos pela derrubada de aproximadamente 500 mil árvores na região, a legislação dos países deve se atentar às políticas expansionistas das fabricantes, garantindo-se o objetivo final dessas empresas, a fim de evitar episódios de desmatamento e mineração ilegal, por exemplo.

Ademais, o fator das tributações à importação de veículos elétricos fabricado na China, pelos Estados Unidos, e aos veículos elétricos chineses e estadunidenses, pela Europa, deve ser analisado com atenção, haja vista a disputa tecnológica histórica entre esses países e a alocação de veículos para novos mercados, fora do eixo do norte global, com destaque para a América Latina. Com a aproximação das eleições nos Estados Unidos, que possui grande influência na política internacional, e os dois principais candidatos à Casa Branca possuindo visões diferentes acerca do futuro dos carros elétricos, pelo menos nos EUA, pode ser um fator que contribuirá para a expansão de outras fabricantes de carros elétricos, não estadunidenses, em mercados estratégicos, principalmente nos países em desenvolvimento, que, além de não possuírem tributações expressivas à importação, possuem um vasto mercado consumidor, possibilitando a expansão do setor em mercados alternativos à Europa e aos Estados Unidos.

7 – Referências Bibliográficas

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  1. Graduando em Relações Internacionais pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). E-mail de contato do autor: viniciusgomescosta.vini@gmail.com ↩︎

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